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Luiz Gustavo Lara e Vitor Adalberto Ferreira
AS FORMAÇÕES DISCURSIVAS DOS RELATÓRIOS EMPRESARIAIS OFICIAIS: CASOS DE CONSTRUÇÃO DE SIMULACROS EM PEQUENAS E
MÉDIAS EMPRESAS
As Ciências Sociais apoiam a ideia de que a língua atua como objeto simbólico para a
produção de sentido, que se transforma no tempo e que também é produzido por interlocutores
carregados de historicidades e de ideologias de uma variedade de interdiscursos (ORLANDI,
2002). Sendo assim, as práticas das Ciências Sociais reforçam a pluralidade dos significados da
linguagem em detrimento da univocidade (GHERARDI; STRATI, 2014). Os especialistas da área
são agentes importantes na produção de sentido. Orlandi (2002, p. 10) expõe que “há modos de se
interpretar, não é todo mundo que pode interpretar de acordo com sua vontade, há os
especialistas, há um corpo social a quem se delegam poderes de interpretar (logo de ‘atribuir’
sentidos), tais como o juiz, o professor, o advogado, o padre, etc.”. De forma análoga, no mundo
corporativo existem diferentes interessados que influenciam a produção de sentido para
representação da realidade, tais como: administradores, contadores, agentes de órgãos
normativos, etc., que na condição de especialistas, produzem determinados discursos e
desenvolvem o que denominamos de práticas discursivas. Forma-se, assim, uma complexa e
impermanente trama de discursos e interdiscursos que, por sua vez, também possuem implicações
nas próprias práticas rotineiras exercidas por esses sujeitos.
Essas práticas são como um tipo de comportamento rotineiro que consiste de vários
elementos interligados. Porém, não possuem apenas o sentido de fazer, o que fica claro nas
palavras de Schatzki (2012, p. 14) ao afirmar que “a practice, on my understanding, is an open-
ended, spatially-temporally dispersed nexus of doing sand sayings”. Desse modo, percebe-se que
a prática, ou uma prática social, envolve não só corpo, mente, coisas (atores não humanos),
conhecimento, estrutura, processo, mas, principalmente, discurso e linguagem (RECKWITZ,
2002). Esses dois elementos ajudaram a compor as bases das teorias da prática, especialmente
com as contribuições de Wittgenstein ao desenvolver a noção de jogos de linguagem, que mais
tarde também colaborou com outras derivações teóricas, como a da prática discursiva
(GHERARDI; STRATI, 2014).
De acordo com o conceito de prática discursiva considera-se que “é preciso entender que
a linguagem é ação e produz consequências” (SPINK, 2013, p. 6), pois uma prática é “o resultado
de uma prática discursiva que criou intersubjetivamente um sentir e um fazer em torno de uma
modalidade de fazer coletivo socialmente reconhecida e reconhecível” (GHERARDI; STRATI,
2014, p. 54). E é com base nesse argumento que se defende que, em uma determinada
comunidade, além de uma cultura própria, por exemplo, também há uma prática discursiva que
Revista de Estudos em Organizações e Controladoria - REOC, UNICENTRO, Irati-PR, v. 1, n. 1, p. 48-69, jan./jun., 2021.